Ontem ao final do dia descobri que havia um tema central no país, as ostras que eu tinha comido em França. No meio de debates e manifs havia vinho e ostras. Cabem-me algumas considerações, matutinas, muito bem dispostas, se me permitem, está um dia lindo.
A bolha ou a ostra. As minhas páginas de Facebook têm 100 mil pessoas. Algo como 3 mil bloqueei. Foi preciso um amigo me ligar para eu saber de algo. Não havia debate algum no país, há uma bolha que acha que a sua verve frenética é um espelho do país. Desde sempre que falei aqui nas minhas páginas do princípio da presunção de inocência. Para mim ele não é jurídico só, é mesmo público, comunitário e abarca desde a fofoca no café, maledicência nas redes sociais, ao assassinato de carácter nos jornais. Apaguei da minha página todos aqueles, de direita ou esquerda que se dedicam a mal dizer, escarnecer, debater pessoas em vez de ideias, interpretar de má fé, sugerir em vez de provar, indiciar em vez de sustentar, gozar.
Sou contra a censura. Apaguei da minha página porque isto é o meu café. Por mim o Facebook deve dar-lhes espaço para dizer tudo, aliás eu acho que as redes sociais deviam ser de propriedade pública e sem censura alguma. Mas o mural é de cada um. Também me afastei da pessoa que na semana passada no café do meu bairro me disse que a senhora tal "cuidava da velhota mas andava a roubar...". Não é por essa pessoa, nem pela velhota, é mesmo por mim. As pessoas que fulanizam os debates, que fazem ataques ad hominem, que propagam boatos, que ofendem, podem contaminar-nos. Somos seres sociáveis. Os outros são um constante espelho nosso. Só de a ter ouvido dizer aquilo senti algo a colar-se pegajoso em mim. E fui logo ao António, da fruta, para ouvir as piadas boas dele sobre a redução do IVA.
Escolher quem lemos, quem ouvimos, com quem jantamos, com quem conversamos, é escolher sobre quem queremos ser. É defender hoje, numa sociedade de escassez onde a inveja circula, uma sociedade de abundância, onde a confiança prevalece.
O facto de eu não ter dado por nada ao final do dia deixa-me descansada, comentei aliás ontem um pouco eufórica, não escondo - finalmente consegui tirar das minhas páginas aquelas centenas de pessoas ressentidas. Sem coragem para debater ideias, muitas das quais aliás passam o dia não a bloquear na sua página, o que é legítimo, mas a pedir que o Estado ou os jornais cancelem quem não gostam de ler, porque disseram algo que os seus frágeis ouvidos não podem escutar. Aliás estas pessoas a rigor até acham que têm que gostar das pessoas para gostarem das suas ideias. Porque como não sabem debater ideias e só debatem pessoas acham que quem não cumpre os critérios morais que elas auto adjudicam a toda a sociedade não deve ser lido. É uma mistura explosiva de alcoviteiros e censores. Se ficou alguém de vós por aqui por favor não deixem de me avisar para eu bloquear já.
Sobre ostras. Adoro. O debate dos vinhos era seríssimo, a minha colega, economista, dirigente nas manifs, que foi deputada local, queria vinho tinto fresco - eu ibérica me confesso, não bebo tal coisa - sabe-me a refresco. Gosto do tinto a 19 graus, de inverno até o junto à lareira. Com camaradagem debatemos o tema, é óptimo falar do que gostamos.
Na realidade confesso que me envergonho de ver as pessoas que trabalham nos supermercados, que transportam as pessoas que trabalham nos supermercados, que ensinam os filhos de quem aí trabalha, e quem trabalha na saúde destas pessoas e delas cuida, a comer mal e cada vez pior. Enquanto os detentores dos supermercados abrem restaurantes onde se come foie gras todos os dias e champanhe a 30 mil euros a garrafa. E onde se debate com intensidade como ilegalizar greves, e atacar quem as defende. O jornal Público, detido por um grupo empresarial que este ano teve um lucro líquido de "342 milhões de euros" fez reportagens sobre como combater o frio com uma manta e chá. Não há jornal nenhum, porque em Portugal não há jornais que pensem e defendam quem trabalha - que não ensine a quem trabalha "a poupar muito e pensar bem" enquanto enaltecem as virtudes dos CEOs que ganham na TAP e em todos lado 30, 40 e 50 mil euros por mês. O governo anuncia uma irrelevante descida de IVA onde também escarnece na nossa cara, enquanto os filhos da desaparecida classe média comem nugets cheios de agrotóxicos e engordam a comer hidratos de carbono.
A palavra de ordem de quem quer mandar é "Comam coratos e fiquem em casa!". A minha é de inspiração francesa, desobedecer, desde a Comuna de Paris até hoje: "Manifestemo-nos pelo direito a dar tudo a todos!".
Haja saúde!
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